De Olho na Literatura - Leitura de Clássicos no momento ideal - por Ricardo Biazotto




Clássicos no momento ideal 
Ricardo Biazotto





Olá, leitores!


A leitura obrigatória é um tema que já causou diversas discussões e, particularmente, sempre estive ao lado de quem defende que isso precisa deixar de existir. Entre todas as mudanças necessárias na Educação, essa é de longe a mais valiosa e faço essa afirmação com base em experiências próprias, sobretudo após o fim da vida escolar e início de leituras que anteriormente não apresentavam o mínimo charme.

Apenas com o passar dos anos que percebi o quanto estava errado ao ignorar os livros cobrados por professores. Mais do que isso, não tenho vergonha de declarar que no passado não era um leitor exemplar. Pelo menos não quando era obrigado a ler um livro sem ao menos conhecer a vida de seu autor e o contexto social de seu enredo. Curiosamente esse é também um dos argumentos do escritor Davi Paiva, que no último sábado publicou um novo artigo da coluna “Fala, Davi!”, em meu blog literário, e explicou o motivo de a literatura brasileira não atrair o povo e ser considerada chata.

O fato é que durante muito tempo tentava me esconder dos grandes clássicos da nossa literatura e hoje sou obrigado a afirmar que isso tornou tudo muito mais especial. Apenas no último ano do Ensino Médio, por exemplo, conclui a leitura de “Macunaíma” e de “São Bernardo” com grandes dificuldades. Que Mário de Andrade e Graciliano Ramos me perdoem, mas na época considerei os dois títulos como os piores lidos até então. Com Machado de Assis a injustiça foi ainda maior. Simplesmente não consegui terminar a leitura de “Quincas Borba”.

Curiosamente o próprio Machado me surpreenderia no futuro e eis o motivo desse texto.

Apenas alguns anos foram necessários para me sentir satisfeito por não ter lido tudo o que foi cobrado durante a vida escolar. A primeira vez em que isso aconteceu foi com “O Cortiço”. Claro que no início a leitura foi cansativa e muitas páginas foram necessárias até me conectar com a história escrita por Aluísio Azevedo, porém cada uma das personagens se tornou inesquecível conforme o autor apresentava uma sociedade que me cativou com suas surpresas.

Manuel Antônio de Almeida foi um dos autores injustiçados por esse que vos escreve. Não seria capaz de totalizar o número de vezes em que seu nome foi citado nas aulas de Literatura, no entanto foram muitas as oportunidades em que ignorei os comentários sobre a obra que marcou a transição entre o Romantismo e o Realismo. Quando o título foi escolhido para um encontro do Clube do Livro em que organizava, tive muito receio da leitura e novamente fui surpreendido. “Memórias de um Sargento de Milícias” acabou se tornando um dos melhores clássicos que tive o prazer de conhecer e na época lamentei muito por saber que seu autor havia falecido muito cedo, sem deixar outro grande trabalho para a eternidade. O tom jornalístico da obra, bem como o humor característico, fazem desse um trabalho que precisa ser lido, relido e trelido.

Mas nenhum clássico se tornou tão marcante quanto “Memórias Póstumas de Brás Cubas” e aqui o nome de Machado de Assis volta a significar algo muito importante em minha trajetória literária. Confesso que esse era o único clássico que tive curiosidade ainda no período escolar. Ora, uma história narrada por um defunto-autor é deveras interessante, mas para um adolescente isso não basta. Apenas o passar dos anos me deixou preparado para uma das melhores obras do maior da literatura brasileira. Se Manuel Antônio de Almeida marcou a transição, Machado de Assis foi o responsável pelo início do Realismo no Brasil, apesar de “Memórias Póstumas de Brás Cubas” não representar apenas um movimento/gênero/autor. A Magnum Opus de Machado, na verdade, está muito além de um único movimento literário e representa mesmo a nossa Cultura. Um livro como esse conquista através de suas passagens marcantes e de críticas únicas, sobretudo quando está em cena Quincas Borba, ironicamente o mesmo que no passado assustou esse que se rendeu a outro trabalho machadiano.


Graças a uma rebeldia quase que insignificante, hoje posso dizer com orgulho que li e apreciei alguns dos melhores textos produzidos em solo brasileiro - apesar de ainda estar devendo. Seria ótimo se todos pudessem esperar o momento ideal para ler os grandes clássicos ignorados no passado, assim como pretendo fazer com “São Bernardo”, “Macunaíma”, “Quincas Borba”, “Vidas Secas”, entre tantos outros. 





Sobre o Autor
Ricardo Biazotto nasceu em Espírito Santo do Pinhal, São Paulo, em 1993. Membro da Casa do Escritor Pinhalense “Edgard Cavalheiro”, participou do Vol. 5 da Antologia Literária Pinhalense e da produção do documentário “Edgard Cavalheiro – Vida e Obra”. Publicou nos livros Equinócios de Amor e Amores Impossíveis, da Alcantis Editora, Sonhos (& Pesadelos), da APED Editora, e Dias Contados – Vol. 2, Moedas para o Barqueiro Vol. 3 e Amores (Im)possíveis, todos da Andross Editora. É colunista da Revista Rosa News e moderador do blog literário overshockblog.com.br. Contato: ricardo.sep22@gmail.com.

2 comentários

  1. Concordo em gênero, número e grau. Também odiei Machado de Assis no Ensino Médio, mas ao relê-lo agora no auge de meus 30 e tantos anos, adorei. Penso que essas obras são densas demais para serem compreendidas por adolescentes. Os professores e pedagogos deveriam repensar o ato de "enfiá-los" goela abaixo em jovens que não estão preparados para isso e que podem jamais voltar a ler o que quer que seja, devido à experiências negativas proporcionadas por uma leitura "empurrada" na hora errada, quando ainda não há maturidade para se compreender e apreender o texto.

    elainevelasco.blogspot.com.br

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    1. Muito bom saber que você concorda com minha posição em relação a esse tema, Elaine. Como você bem disse, é preciso repensar a maneira como a literatura é apresentada nas escolas. Claro que existem livros capazes de criar o gosto pela leitura, como Harry Potter, por exemplo, mas não podemos contar apenas com a sorte - afinal, acaba sendo uma questão de sorte um aluno criar esse gosto. Infelizmente.

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